Sobrevoar Lisboa
Sinto uma enorme pressão no cocuruto, sempre odiei as descolagens graças a esta bizarra sensação de aperto da cabeça às nádegas. Decido distrair-me com a janela e apreciar a paisagem. Vejo as margens do rio unidas pela ponte, que harmoniosa que é, com as suas cores de tijolo aos losangos imponentes sobre a água. Admiro-os melhor por cada vez que o avião muda a direção para se alinhar rumo ao destino.
Da baixa lisboeta ergue-se a cidade nas encostas feitas de história como tantas que vivenciei, talvez com um pouco de álcool a mais no sangue. Passa-me um frio arrepiante pela pele, desligo o ar condicionado e volto-me novamente para sentir Lisboa. A torre de Belém e o Castelo de São Jorge são os monumentos onde escolho pousar o olhar. Grandiosos monumentos em pedra soberbamente construídos ali há tantos anos atrás, com um propósito que não é o mesmo de hoje. Ao fundo observo a serra de Sintra e vêm-me à memória os cheiros da minha infância. O musgo húmido e o cheiro a terra molhada fazem-me recordar o caminho até à vida adulta que, forçosamente, me deu acesso direto a este lugar confortável onde vou sentada agora. Já na trajetória certa, vejo toda a costa e o mar cheio de espuma resultante da sua tormenta. Em instantes, a espuma passa a ser um fino fio branco bem lá em baixo e as nuvens começam a surgir, tornando-se numa camada cinzenta quase opaca. Lisboa está triste, não pelo nevoeiro, mas pela minha partida!
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👉 Um desafio do curso de escrita criativa de @analitaalvesdossantos