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Tem juízo, Joana!

Entre o certo e o errado, o perdido e o achado, o dito e o não dito, encontros e desencontros, da pequenez à plenitude, entre a moralidade e a indecência. Se tenho juízo? Prefiro perdê-lo…

Entre o certo e o errado, o perdido e o achado, o dito e o não dito, encontros e desencontros, da pequenez à plenitude, entre a moralidade e a indecência. Se tenho juízo? Prefiro perdê-lo…

22
Nov24

Todas as personagens têm uma história (3)


Correu de braços abertos para o pai. Tão abertos e intencionados como se quisesse transplantar o seu coração para o lugar do dele. Assim eram os seus abraços e o brilho dos olhos dele.

— Papá, touxe jinhos! — Chuack! Chuack! Chuuuuak! E ele deliciava-se com aquelas mimosas recepções.

O seu cabelo fazia lembrar um campo de searas de trigo com leves e tímidas ondulações, idênticos aos da mãe quando tinha a sua idade. O lábio inferior, mais volumoso que o superior, rasgava-se num sorriso com a facilidade do vento e nas gargalhadas vislumbravam-se quatro blocos de granito tão minúsculos, mas que sobressaíam com o brilho de quem está a crescer rápido.

Desejava intensamente a atenção do pai, tanto quanto brincar nas poças de galochas.

— Pai! Pai! Pai! Pai! Pai! — até que os seus olhos a admirassem com o carinho desmedido habitual — Oh paiiiiiiii!

— Diz, filha!

— Puque é que as foias mudam de cor?

Depois de pensar um pouco, observando as bochechas de algodão doce, sorriu e respondeu:

— Ora, filha, porque existem estações do ano. Durante o ano, o tempo vai mudando, faz calor, frio, etc. e as folhas resistindo a estas alterações de temperatura têm de mudar.

— Oh! Têm de mudar puquê? Eu adolho que sejam vedes… não castanhas, todas xujas no chão. — diz de braços cruzados e a franzir o sobrolho.

— Pois é, Margarida! As folhas mudam conforme os ciclos da natureza. Assim como nós também mudamos. Tu vais mudar, porque vais crescer, vais brincar, vais conhecer mais amigos que te vão “pintar” de outras cores também. Tal como as folhas. E se gostas delas verdes, lembra-te que tiveram de cair outras castanhas para dar lugar a essas verdes. Por isso, as castanhas são tão bonitas quanto as verdes.

— Ixo qué dizer que, quando eu for glande, poxo ser difente de agolha?

— Ah sim! Com certeza!

— Serei maior!

— E não só!

— Hum? Vou ser doutra cor?

— Vais ser diferente, mais crescida, os teus cabelos também irão crescer, podes ser mais sorridente, podes gostar ainda mais de fazer bolos, ou não! Podes ser ótima nos escorregas ou até ter medo deles… não sabemos! Assim como poderás gostar de cantar, brincar com outras coisas que vais descobrindo…

— Mas vou continualhe a ser a Margarida?

— Se quiseres, sim! Tudo o que vais sendo e fazendo dia após dia, o que vais sentindo, as pessoas que vais conhecendo… tudo faz parte de ti!

— A mãe também?

Apanhado de surpresa, fez silêncio… tentou controlar-se, mas as lágrimas aproximaram-se das pálpebras à velocidade da luz, respondeu apenas:

— A mãe viverá sempre em ti, filha!

10
Out24

Todas as personagens têm uma história (2)


Por baixo das peles que quase lhe fecham os olhos, vive um olho mel atento a tudo o que consegue ver. Nos seus pensamentos dançam conversas honestas de quem se quer expressar, mas a vasta experiência pede à língua um silêncio atinado.

Os dias somam-se, as noites dão que falar e o que deveria ser prazeroso no verbo envelhecer, é substituído pela dor de um verbo a quem chamam saudade. Os joelhos rangem como as velhas portas, as mãos mexem-se tortas lembrando os galhos das árvores e o coração… bate cansado de saudade dos tempos que vivia naquele mesmo corpo sem sequer dar conta.

No meio daquela algazarra de mais um Natal em casa de uma das suas filhas, Luísa permanece sentada no seu cadeirão. Já jantou o bacalhau, que estava em sonso, com couves mal cozidas. A sua Gabriela nunca teve jeito para a cozinha! Ainda assim, insiste em fazer o Natal em casa dela. “Valha-me Deus! Agora espero o arroz doce que fiz e que, mesmo sabendo que está ainda melhor do que o ano passado, vou-me fingir modesta e perguntar a todos se está bom de açúcar.”

As flores que dela floresceram deram-lhe o cabelo branco, uma audição mouca e um colo macio e despretensioso, onde os netos fazem sestas e as filhas procuram a compreensão.

Por trás dos seus lábios em forma de foice invertida, até aos cantos da boca a gravidade faz o seu trabalho, ria-se discretamente das traquinices dos netos. São só dois, “estas duas só quiseram ter um filho cada uma, antigamente paria-se como quem troca de roupa: rápido, sem frescura e já a pensar no próximo!“

Os genros tratavam-na delicadamente, e, apesar de a amarem como se da própria mãe se tratasse, quando lhe falam de amor é com um subtil desdém. “Os homens não foram educados a amar descaradamente… palermas! O meu amou-me tanto que até com amor me açoitava.”

Levantou-se do cadeirão, era hora da sobremesa, agarrou-se à sua bengala tigresa, não era uma bengala qualquer. Lá foi sentar-se à mesa, com dor naquele maldito joelho, recordação que levaria consigo para sempre da noite de verão em que o Zé decidiu chegar a casa chateado com pormenores e fraturou-lhe a rótula. Os pormenores nunca saberemos, a rótula ficou partida e o coração rachado, por um amor que nunca conseguiu compreender…

“Deus o tenha na paz do Senhor, amén.”

27
Jul24

Amanhecer


O primeiro comboio da manhã passou, o silêncio é agora o nascer de mais um dia agitado. Há o cantar de um pássaro lá fora, mas é a tua respiração o meu pano de fundo de todos os amanheceres. Os teus lábios cingelamente repousados um sobre o outro e o teu ar tranquilo, fazem-me querer-te acordar para ganhar o primeiro sorriso do dia. Ao invés, toco-te ao de leve na mãozinha que está do meu lado da cama, agarras-me o dedo e suspiras. Nesse momento, o meu amor por ti é o máximo que posso sentir no peito!

Segundo comboio… a vida recomeçou para lá destes lençóis macios e quentes. Eu ainda aqui estou, porque não há nada que me tranquilize mais do que ver a tua barriguinha subir e descer ao ritmo de uma música de embalar que só toca dentro da minha cabeça. “O balão do João, sobe sobe pelo ar… está feliz”, o João, assim como tu que agora esboças um sorriso e viras-te para mim, a sonhar. Talvez com balões, animais, nuvens? De que são feitos os teus sonhos, filha? É, afinal, nesse instante, que o meu amor por ti atinge o máximo que posso sentir.

Fora deste ninho de amor apitam carros enfurecidos, sei lá porquê ou para quê. Não me identifico com a ira que conduz nas estradas. O frenesim obrigatório de uma sociedade em rebanho, faz-me questionar porque é que ainda aqui estou. Já não era suposto.

Vejo-te espreguiçar, entreabres os olhos para veres quem te rodeia, porém continuas a querer dormir. Nos amanheceres do mundo existe a agitação de um novo dia, nos teus a ronha e o demorado despertar tardio, cheios de dengo e apego. Não era suposto? Quando vou ter isto outra vez?

Deixo a confusão lá fora, observo-te pela milésima vez, só porque, a meu ver, nunca é demais. O teu corpo miúdinho contrasta com o tamanho do meu amor por ti. Espreguiças-te novamente ao mesmo tempo que empurras os lábios carnudos para fora, bocejas e olhas para mim com um leve sorriso. Afinal de contas, é neste instante que o meu coração explode de amor por ti, atinge o máximo de amor no meu peito!

Começas a sussurrar monossílabos sem sentido, contas-me os sonhos, os desejos do dia e mais sabe-se lá o quê. Balanças-te como se estivesses a mobilizar o corpo para enfrentar o dia que aí vem. Será, então, este o máximo do amor que vou sentir por ti? Todos os dias parece atingir um limite que julgo difícil ultrapassar e… no instante seguinte, é excedido!

É um extrapassar fronteiras de amor a todos os instantes. Então, escrevo-os para os eternizar a todos. Se não era suposto, não compreendo e continuo a preferir ficar aqui contigo a eternizar estas memórias cheias de inocência, pele e graça.

20
Jun24

Mérito


Há o silêncio das madrugadas não dormidas,

 

Há uma força invisível que move os despertares e os dias corridos,

 

Há uma mente cansada que finge raciocinar, mesmo adormecida,

 

Há uma batalha vencida, sem guarida, mas o caminhar no trilho que parece o certo.

 

Não há aplausos, mesmo em esforço e glória.

 

Existem detalhes escondidos e a vitória num coração que não desiste.

 

Despida de vaidades, ouve-se a melodia suave de uma alma que se alegra no simples ato de fazer.

 

Cada passo, mesmo o mais anémico, tem a força de mil homens e os sonhos terreno fértil.

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