O primeiro comboio da manhã passou, o silêncio é agora o nascer de mais um dia agitado. Há o cantar de um pássaro lá fora, mas é a tua respiração o meu pano de fundo de todos os amanheceres. Os teus lábios cingelamente repousados um sobre o outro e o teu ar tranquilo, fazem-me querer-te acordar para ganhar o primeiro sorriso do dia. Ao invés, toco-te ao de leve na mãozinha que está do meu lado da cama, agarras-me o dedo e suspiras. Nesse momento, o meu amor por ti é o máximo que posso sentir no peito!
Segundo comboio… a vida recomeçou para lá destes lençóis macios e quentes. Eu ainda aqui estou, porque não há nada que me tranquilize mais do que ver a tua barriguinha subir e descer ao ritmo de uma música de embalar que só toca dentro da minha cabeça. “O balão do João, sobe sobe pelo ar… está feliz”, o João, assim como tu que agora esboças um sorriso e viras-te para mim, a sonhar. Talvez com balões, animais, nuvens? De que são feitos os teus sonhos, filha? É, afinal, nesse instante, que o meu amor por ti atinge o máximo que posso sentir.
Fora deste ninho de amor apitam carros enfurecidos, sei lá porquê ou para quê. Não me identifico com a ira que conduz nas estradas. O frenesim obrigatório de uma sociedade em rebanho, faz-me questionar porque é que ainda aqui estou. Já não era suposto.
Vejo-te espreguiçar, entreabres os olhos para veres quem te rodeia, porém continuas a querer dormir. Nos amanheceres do mundo existe a agitação de um novo dia, nos teus a ronha e o demorado despertar tardio, cheios de dengo e apego. Não era suposto? Quando vou ter isto outra vez?
Deixo a confusão lá fora, observo-te pela milésima vez, só porque, a meu ver, nunca é demais. O teu corpo miúdinho contrasta com o tamanho do meu amor por ti. Espreguiças-te novamente ao mesmo tempo que empurras os lábios carnudos para fora, bocejas e olhas para mim com um leve sorriso. Afinal de contas, é neste instante que o meu coração explode de amor por ti, atinge o máximo de amor no meu peito!
Começas a sussurrar monossílabos sem sentido, contas-me os sonhos, os desejos do dia e mais sabe-se lá o quê. Balanças-te como se estivesses a mobilizar o corpo para enfrentar o dia que aí vem. Será, então, este o máximo do amor que vou sentir por ti? Todos os dias parece atingir um limite que julgo difícil ultrapassar e… no instante seguinte, é excedido!
É um extrapassar fronteiras de amor a todos os instantes. Então, escrevo-os para os eternizar a todos. Se não era suposto, não compreendo e continuo a preferir ficar aqui contigo a eternizar estas memórias cheias de inocência, pele e graça.